sexta-feira, 19 de abril de 2013

Canto


Desafinados, os barulhos saem libertos
Carregando qualquer mensagem outrora
Sem hora, os sonhos fogem dispersos
Nunca mais objetos de penhora.

Sem partitura, o ritmo acontece
E o tempo dissolve-se sem agonia
A melodia corre para abraçar quem merece
A sensação é de amor e eufonia.

Inocente, revela segredos e mundos e céus...
Porções de desejos que a vida sequestra
Mas todo o encanto refugiado em mil véus
Fica bem sólido nessa simples orquestra

O vento sopra a música e apaga as migalhas
Capaz de fazer alguma paz surgir
Discreto e calmo desconhece batalhas,
O canto que só os anjos podem ouvir.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Silêncio


"Não tenho medo do grito dos violentos, 
dos corruptos, dos desonestos, 
dos sem-caráter, dos sem-ética. 
Tenho medo é o silêncio dos bons."
Martin Luther King


Eu vejo um mundo inteiro. Um infinito que só eu enxergo. As flores estão caídas nas calçadas curvas descansando uma vaidade silenciosa sobre o concreto. Eu aqui, calada, procuro uma esperança em cada esquina ou, uma novidade. Mais um dia e não apenas um dia a mais. Calo. Sinto. A solidão fotografa abstrações da minha mente. No silêncio branco, afasto qualquer excesso sufocante, porque calar é falar também. Falar com sua própria carga, com seus pensamentos e seus sonhos. Estar consigo é uma relação vibrante. Estrelas e faíscas. E simples. Sem discurso, cordialidades, sem roupa e sem medos. Vejo, de onde estou - em qualquer lugar agora - multidões inacabáveis, e sei que todos eles estão bem mais sozinhos que eu. Ter a si é necessário. Pertencer a si é um dom, um remédio.
Lá fora, chuva. Aqui, minhas próprias gotas ecoam reflexões tão lindas e completas que me atraem como um ornamento, pela sua forma única. Cheia de um horizonte meu e uma liberdade sem fim. Cheia da uma perspectiva minha e de promessas minhas. De mansidão, viagens, amor e tempo. Cheia de mim e de sussurros. Se a chuva vai embora, meu silêncio retoma todos os seus gritos e conversas, parecendo de longe, fogo em tons laranja. É quando sinto que o tempo nem passa e que a calma é quase eterna ou, que as cores do espectro suavizam-se. Quando tudo volta a fazer sentido novamente, a certeza é quase absoluta e permanente.
A noite surge tão inocente, trazendo um cheiro distante de mar e felicidade e então me pergunto por que não crer nas minhas vontades - tão vivas - e por que não desperdiçar coragem para realiza-las. Por que não qualquer coisa agora?..
Cada um leva consigo seus sentimentos, cansaços, coleções da vida e problemas quase insolúveis, mas quase ninguém cala. Silenciar é crescer e nunca é caro o preço a ser pago. A propósito, o mundo está tão calmo nesse momento e a luz da lua é suficiente. Sem censura, vou sentar na varanda e com o vento, calar.

terça-feira, 2 de abril de 2013

Alea jacta est

Os pedaços agora, estão desmazelados. Pedaços despedaçados. Faz sentido? Tá sentindo? Ela não sabe mais e nem quer saber. Os cacos estão espalhados pela cozinha, roupas e vidas. Na ponta dos pés, ela luta agora, para não pisar em seus próprios resquícios cortantes. Mas, atendo-se a pormenores e fotos empoeiradas, acaba tornando os cortes ainda mais profundos esperando sabores de mudança. E nada acontece. E nada nas águas que a alguns instantes antes, rolavam pelos seus olhos e visitava seu rosto tão lindo e cansado, tentando não se afogar. E mais uma vez, nada. Todas as memórias e cartas e todos os "tudos" faziam-se presentes numa vontade gritante de que o tempo pudesse voltar, nem que fosse por um sopro. Sem sono e nômade como vento da noite, queria rebobinar. Rebobinar o carpe diem. Poder voltar todo o filme e revivê-lo, porque, para ela, só existia aquela história. Em vezes esparsas, reunia em suas mãos pequenas, boas vibrações e retalhos de força que em qualquer pouco tempo, não produzia efeito algum. E ela, se quebrava. E mais uma vez, pedaços. E mais uma vez, tudo outra vez. A vida então, era um eterna estiagem que roubava todas as chances de felicidade e calmaria. Luz de lanterna insistente, flutuando ausente e alienada. Como borboleta que não mais pode bater as asas, fazia-se quietude. E quieta, dissolvia-se em imaginações, dúzias de hipóteses e dardos lançados mentalmente. "E se...?".
Cansada, ela resiste. Calada, caminha acreditando na elasticidade do elo. Duelo. Cavando covas para enterrar assombrações e arriscando a própria sorte, ela resiste. Com todas as angústias e com o medo de que tudo (de repente) esfarele e seja levado pelo vento. Resiste mesmo assim, porque ninguém nunca havia dito que seria fácil e indolor ou que só existiria compasso e risos. Resiste dizendo repetidas vezes, que vai dar certo, parecendo extremamente forte e corajosa. E talvez fosse. E talvez, seja agora. E daí que esteja im(possível) demais? Resiste, a menina de armadura, porque quer amar. Amar, dura. 
Lá fora, o mundo gira. Pessoas, teleféricos e imagens. O vento típico da época retoma sua velocidade. Para ela, nada agora é visível. Da boca, um gosto molhado e salgado. Suspirando, sente o peso da memória puxando-a de volta ao passado. Ela poderia ter se livrado daqueles flashes e da realidade sem moldes, mas deitou-se fechando os olhos com toda força, deixando que tudo viesse à tona. Ela sempre permitia que os sentimentos voltassem...

A sorte está lançada.